Com o aumento da pressão imobiliária e da escassez de habitação acessível, a ocupação ilegal de imóveis, vulgarmente conhecida como “ocupas”, tem vindo a ganhar maior visibilidade em Portugal, sobretudo nas zonas urbanas. 

Estas situações, que envolvem frequentemente propriedades devolutas ou abandonadas, levantam questões jurídicas e sociais complexas, tanto para os proprietários como para as autoridades. Mas afinal, o que diz a lei portuguesa sobre este fenómeno e qual é a relação entre ocupas e usucapião?
Na linguagem comum, um ocupa é alguém que entra e permanece num imóvel sem o consentimento do proprietário. Esta ocupação pode ocorrer em casas, apartamentos, terrenos ou outros tipos de bens imóveis, sem qualquer contrato, sem pagamento de renda e sem vínculo jurídico.

Legalmente, estamos perante uma posse ilegítima. O proprietário, nestes casos, tem o direito de recorrer aos tribunais para reaver o seu bem, seja através de uma ação de reivindicação ou de despejo, consoante a situação. No entanto, a complexidade aumenta quando a ocupação se prolonga no tempo e é aí que entra a figura do usucapião.

O usucapião é um mecanismo legal previsto no Código Civil que permite a aquisição da propriedade de um bem, móvel ou imóvel, através da posse frequente, pacífica e pública, mesmo que sem título formal. No caso dos imóveis, os prazos legais variam:

15 anos, no caso de usucapião ordinário, com base numa posse pacífica e de boa fé;
20 anos, no caso de usucapião extraordinário, mesmo sem justo título ou boa fé.

Ou seja, se alguém ocupar um imóvel durante vários anos, sem contestação do legítimo proprietário e comportando-se como verdadeiro dono, por exemplo, pagando despesas, fazendo obras e residindo de forma estável poderá, em certas condições, adquirir o direito de propriedade através do usucapião.

É essencial compreender que nem toda ocupação dá origem a usucapião. A mera presença não autorizada num imóvel não é suficiente para conferir direitos legais. Para que o usucapião seja aplicável, é necessário demonstrar uma posse qualificada: contínua, pública, sem oposição e com comportamento de proprietário.

Contudo, a falta de ação por parte do proprietário ao longo do tempo pode ser prejudicial. Se não houver contestação, fiscalização ou qualquer gestão ativa do imóvel, o risco legal aumenta, especialmente se o imóvel não estiver corretamente registado.

Como proteger o seu imóvel?
Para evitar surpresas desagradáveis, os proprietários devem adotar algumas medidas preventivas simples, mas eficazes como:

Registar e manter atualizado o imóvel na conservatória do registo predial;
Realizar visitas periódicas a imóveis devolutos ou não habitados;
Colocar sinalização visível indicando que o imóvel é propriedade privada;
Solicitar a intervenção das autoridades sempre que detetada uma ocupação;
Garantir que portas, janelas e acessos estão seguros;
Manter o imóvel ativo (limpezas, pequenas manutenções, etc.);
Guardar toda a documentação que comprove a posse e propriedade;
Consultar um advogado imediatamente em caso de ocupação.

Em contexto internacional, os casos de ocupas são mais mediáticos noutros países como Espanha, França ou Itália, a legislação portuguesa tem especificidades importantes. Em Portugal, o direito de propriedade está protegido pela Constituição, e o usucapião exige prova rigorosa. Ainda assim, como noutros países, a passividade do proprietário continua a ser um fator determinante para o sucesso de muitas ações de usucapião.

Assim, conclui-se que a ocupação ilegal de imóveis e o usucapião são temas juridicamente complexos que exigem atenção, conhecimento e, sobretudo, ação por parte dos proprietários. Manter os imóveis registados, vigiados e em uso é a melhor forma de proteger um dos bens mais valiosos: a propriedade.