A venda de um imóvel com lucro gera, para o Fisco, uma mais-valia sujeita a tributação. A este ganho podem ser deduzidas várias despesas, como impostos e custos com obras, mas os juros pagos em créditos habitação não entram neste cálculo. Eis o porquê, com fundamento jurídico.
O Código do IRS define que o ganho tributável corresponde à diferença entre o valor de venda e o valor de aquisição, deduzidas as despesas necessárias e efetivamente suportadas no âmbito da aquisição e alienação (art.10.º, n.º 4).Entre estas despesas incluem-se o IMT, registos, custos notariais, obras de valorização e comissões de mediação — mas não os juros do financiamento.
A exclusão dos juros resulta de uma opção legislativa: são considerados despesas financeiras pessoais, não diretamente relacionadas com o valor patrimonial do imóvel. No entanto, esta interpretação gera dúvidas, especialmente quando o custo do crédito representa uma parte significativa do esforço financeiro do contribuinte.

A distinção torna-se ainda mais evidente ao comparar o regime dos particulares com o das empresas:
  • Empresas: podem deduzir os juros dos empréstimos contraídos para aquisição de imóveis, tratando-os como custos na determinação do lucro tributável (artigos 17.º e 23.º do Código do IRC).
  • Particulares: não podem deduzir juros na venda de imóveis; apenas despesas como IMT, escritura, registos, obras e comissões.
  • Particulares com imóveis para arrendamento: podem deduzir os juros como encargo da atividade, mas apenas na categoria B do IRS; na categoria F (ganhos com venda de imóveis) essa dedução não é permitida.
Ou seja, o mesmo encargo financeiro é tratado de forma diferente conforme o sujeito passivo e a natureza da operação. Enquanto os juros pagos pelos particulares não são dedutíveis, nas empresas são considerados custos, o que levanta questões de igualdade tributária e capacidade contributiva.

O impacto desta regra e possíveis soluções

Ao não considerar os juros como custo no cálculo das mais-valias, o sistema fiscal penaliza quem depende do crédito para comprar casa — em especial a classe média e baixa —, tributando ganhos que, na prática, não refletem lucro real.
Vários países europeus adotaram soluções para equilibrar justiça fiscal e realidade económica. Em França e Alemanha, há regimes que permitem considerar encargos financeiros, ainda que de forma limitada ou proporcional. Países Baixos e Bélgica aplicam deduções parciais ou mecanismos de compensação, sobretudo quando o imóvel é para habitação própria ou há reinvestimento em condições específicas.
Em Portugal, uma reforma que permitisse a dedução parcial dos juros ou aplicasse um limite proporcional poderia:
 
  • Corrigir distorções fiscais;
  • Promover maior mobilidade habitacional;
  • Reforçar justiça e equidade no tratamento fiscal das mais-valias;
Alinhar tributação com políticas sociais e económicas.
Além disso, permitiria que, na tributação real dos rendimentos da categoria F, fossem deduzidas as despesas efetivamente realizadas para obtenção do rendimento.